Wednesday, December 25, 2024

Omeprazol

Ph digestivo: 0.8
Ácido clorídrico


Foi a comida
Montanhas demolidas
Para tapar aquele vazio esóterico

Ou as palavras não-ditas
Amontoam-se insatisfeitas
Insalubres, indissolúveis
Indissociáveis do mal-estar negado

Tentativa de assassinato do afeto
Esguio, sobrevive
Dispara de volta
Atinge no esófago
Jorra um ardor absoluto

É o preço a calar
Atraiçoar o corpo
Pelas comodidades
De tentar negar
Áspera noção
Conflito e oposição

Wednesday, December 4, 2024

Fimbulvetr

Enterrado na escuridão
Não sei mais
Se na noite me findo
Ou se da madrágora eu vim
Por instantes olvido
Noções obsoletas
Do frívolo ora 
Nem jamais outrora

Existo apenas por sustento
De atividade cognitiva
Ou sugestão hipnótica
De deuses alucinados
Loucos, inventados 
Não fosse eu ser engolido
Por minha nula valia

Sou visitado por fumo preto
Permito que se embrenhe
Nas cortinas, na roupa, na pele
Nos ossos, na medula
Entranhado na própria alma
Sacrifico meus pulmões
Em nome de um castigo
Que pouco interessa
A divindades de conveniência
Salvo por minha heresia
Sei não ser possivel
Se algum Deus vivo ofendi
Além daqueles que imaginei

Em minha catatonia
Aguardo pelo fim
Enquanto as nações
Se canibalizam
Com a ponta das lanças
Obscurecem o sol

Sunday, August 11, 2024

É em lamento

É em lamento
Que tudo passa
Que tudo pesa
Que tudo se pesa
Que tudo se perde

É em lamento
Que se principia
Que se perece
Que se adoece
Que se definha

É em lamento
Um horizonte
Que se sedimenta
No estômago

Um castigo
Auto-infligido
Permissivo
É uma guerra civil
Regida por Saturno
É um Fado trágico
Engolido por dentro
Dissolvido por quimeras
Na barriga, inteiro
Do inventário da imaginação

Aguardas em quarto minguante
À espera de diagnóstico
Mas sem surpresas
Especialista dos crimes
De teus antecessores
Do que padecem eles
Não podes delegar
É-te dado mesma sentença
Mesmo desdém
Dos enfermos da Lua

Saturday, June 8, 2024

Noite Eterna

Perante evidências deixadas
Pela mais longa lança
Que esventra em silêncio absoluto,
As horas dilatadas,
Desdobradas em cartas deliberadas,
Atiradas à mesa de cabeceira

Lançando desejos à lua mágica
Dotada de intenção e imaginário
Inclinado sobre o parapeito da galáxia
Evito inspirar o ar rarefeito
Um lembrete solipsista 
De que pinto o distante de engano próprio
Só para não me afogar em existencialismos

São numerosas as vezes
Que caio nesse logro
Solitário labirinto do pensamento
Que se entranha em espaços intracranianos
Normalmente anestesiados no conflito neurótico
É com brechas por onde raiam veias
Suplicantes de sono oxigenado
Que disseco em enciclopédias
A dor diurna cedimentada até aos ossos

Não há outra forma
Oh! Assim que cai a cortina carmesim
Não há qualquer descanso!
Que soturna existência! 
É com constante formigueiro
De alucinadas octavias batidas
No sotão latejante carcomido pelos elementos
Que se enterra o dia e nasce a noite eterna

Friday, April 19, 2024

Querendo voltar para onde mais não tem lugar

Áspera razão de ser
Sem acalentos
Ao relento se dorme
Não fosse a insónia 
Incrustada na pele
De sopros antediluvianos
Pudesse a morte voltar
A alucinaria ali

Esclerótica, faminta,
Cobradora de impostos.
Com olhos pulsantes
Jorrando horrores ancestrais
Enclausurados, denegados por mim
Como se 
Os pudesse expurgar 
Proibir de voltar
Iludir-me
Com poder sobre essa culpa 
Que os sustém, que me entretém

Conseguisse eu
Deixar à porta
Suplicante castigo
Dor acutilante
Vinda lá de longe, do frio
Do mundo dos espíritos
Querendo voltar
Para onde mais não tem lugar

Saturday, February 17, 2024

Pulsão de Morte

Trago comigo o abismo
No bolso da esquerda
Fica um vácuo, um pesar
Uma pedra, um Golias.
Tudo de vaidade e valía, 
No ventrículo direito,
Afastado desse poço sem fim.
Albergado ali, num passo irregular,
Um corpo dual atraiçoa, se separa de mim e se lança
Por aí abaixo num calafrio
Que violenta a líbido, repugna a alma.

Fico horas nesse ensaio
Aumentando a distância ao luar,
Até aos príncipios da Terra.
Contando o tempo nesse balance,
Em que gritam as valquírias,
Esventrando-se dentro de mim.
Entre este mundo e o outro,
Sem desejo mais nem tormento,
O átomo despossado de si.

Fica a rebeldia,
De me manter nesse acre pós-humano.
Sobreviver após todos os núcleos serem lançados,
Ver o que brota dessas sementes do caos.

Thursday, January 4, 2024

33:33

É aquela hora demoniaca
Apenas artistas, cultistas, 
Proscritos ocultistas
Fazem turno de vigília 
Este infame protagonista
Sofre intrigas, abdica do dia,
Pela noite mal dormida
Talvez as trevas segurem o impostor
Esperneante entre fendas e paredes
Não se deixa apanhar
Para se cobrar devida renda
Trapaceiro de profissão
Especialização em roubo de identidade
Pé ante pé arqueado pela sombra
Cruza-se comigo de manhã
Sequestra-me, vestindo minha carne
Numa imitação ínfera de mim

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